quarta-feira, 31 de julho de 2013

ENTREVISTA SOBRE O BAIRRO URUGUAI
E A RUA HAROLDO DE SÁ

Três moradoras do bairro Uruguai deram suas contribuições para nosso blog, concedendo uma entrevista que me facilitou conhecer melhor o meu lugar. São elas: Sª. Ivone Cruz – 76 anos de idade e Sª. Solange Bastos – 60 anos de idade (minha mãe), Srª. Valdimira. 

1°) QUAL A ORIGEM NO NOME DO BAIRRO?
As Três pessoas entrevistadas disseram que o nome foi influenciado pela vitória da Seleção de Futebol do Uruguai sobre a Seleção Brasileira na copas de 1950, mas não sabem quem decretou o nome. Contudo, a Sª. Valdimira relatou que na verdade há especulações, mas ninguém afirma ao certo a origem do nome: “uns diziam era Mares Alagados, outros diziam que era Rua Direta dos Mares, o lado da Regis Pacheco foi chamado de Tomé de Souza que incluíram como Uruguai. Só que o Sr. Paulo Bispo que foi presidente da sociedade Tomé de Souza fez uma solicitação à Câmara de Vereadores e o bairro voltou a ser chamado de Tomé de Souza e o Outro lado de Uruguai e Alagados por causa das palafitas”.

2°) COMO FOI CONSTRUÍDO O BAIRRO?
Solange: Foi construído com restos de lixos pelas pessoas que moravam nos alagados (Seu pai Olavo Bastos lhe contou a história).
Ivone: Antes o bairro era um manguezal e depois foi invadido e construído com restos de lixo e restos da maré.
Valdimira: O bairro foi entulhado, começando da Regis Pacheco, Rua Direta e Baixa do Fiscal. As primeiras casas eram de madeira sob as águas. Assim foram formando as ruas, Haroldo de Sá, Inácio de Loiola, Ramagem Badaró, daí veio as casas de Sopapos (barro). Utilizavam os lixos da cidade e assim as ruas eram feitas.

3°) COMO ERA NO INÍCIO O ASPECTO DO BAIRRO?
As três pessoas entrevistadas disseram que tinha muito lixo, maré, as primeiras casas eram de madeira, os chãos das casas eram de areia batida, antes de construir a ruas só existiam avenidas e vilas e que não tinha rede de esgoto.
Solange: Antes só existia maré, casa de madeira, não tinha saneamento básico, era construído de resto de lixo e cascalho de mariscos, as casas eram de madeira e o chão tinha areia batida.
Ivone: Sem luz, a iluminação era com candeeiro e fifó, tinha muita lama e por isso muitos insetos.
Valdimira: O bairro tinha um aspecto de estrema pobreza, onde os moradores eram operários da construção, eram os pedreiros, ambulantes, vidreiro, pescadores, lavadeiras, costureiras que ajudaram a construir o bairro. Era um lugar muito simples, com pouca iluminação.

4°) COMO ERA O COMÉRCIO, A FORMA DE TRABALHO?
Solange: Tinha muitas quitandas, a feira do curtume, a feira do rolo que vendia coisas velhas, frutas, e fazia troca de objetos, tinha o rapaz do pão que ia de bicicleta ou na carroça, tinha a fábrica de sabão que ficava onde agora funciona o Atacadão Recôncavo e tinha a empresa de ônibus elétrico CBTC. Eu lembro que tinha também os marisqueiros.
Ivone: A única forma de trabalho era com vendas tipo quitanda, feira do curtume e biroscas.
Valdimira: O comércio era um armazém como o armazém 70 na entrada da rua Araújo Bulcão, a feira de são Joaquim e os bares que também vendiam peixe, farinha, feijão e etc.

5°) QUAIS ERAM AS ESCOLAS DO BAIRRO? FALE SOBRE A ESCOLA DE Profª Carmelita.
Solange: Tinha a Escola Pública Jesus Cristo, a Escola Bom Jesus que era um convento também, e a Escola de D. Carmelita era a Levi Miranda que foi a primeira escola particular que eu me lembro, a maioria dos moradores que podiam pagar pelos estudos, estudaram lá e hoje a escola tem o nome O Alfa.
Ivone: Tinhas as escolas públicas, eu me lembro que uma virou convento, era a Escola Bom Jesus, e a Escola Levi Miranda de D. Carmelita era muito boa, era particular, iniciou em sua residência e depois foi ampliando e transformando numa escola, mesmo tendo a casa da família num dos andares, as professoras todas são da mesma família. Meus filhos e netos estudaram lá. Hoje a escola tem outro nome e minha bisneta estuda nela, agora é O Alfa.
Valdimira: Apesar da pobreza do bairro e da pouca condição de moradia, alguns moradores conseguiram estudar, uns formara-se professores, militares, médicos, mas havia muitas dificuldades. Com a fundação da sociedade Tomé de Souza em 1952, que levou o nome do bairro à Câmara de Vereadores, muitos benefícios forma conseguidos como a Escola Tomé de Souza, onde estudou Paulo Bispo da Silva, Biomásio, Orlando, Mestre Olavo... Muitos foram presos do golpe militar em 1964, até mulheres fazem parte dessa história. Foi criada em 1952 a Sociedade 10 de Outubro que seus moradores mantém até hoje e que ajudou o bairro a crescer na educação, depois foi criado o Centro recreativo e Cultural do bairro, tinha a escola Tomé de Souza que ainda existe, a Almerinda Costa e a Levi Miranda que hoje é conhecida como Escola O Alfa.

Imagens da Escola O alfa (Antiga Escola Levi Miranda)
                               

6°) FALE SOBRE A EMPRESA DE ÔNIBUS QUE TINHA NO BAIRRO.
Solange: A empresa ficava no largo de Roma perto aqui do Uruguai. Era um ônibus grande, em cima tinha fios. Não me lembro bem o nome da empresa, mas acho que era CMTC.
Ivone: Tinha um ônibus que rodava no bairro e supria a necessidade dos moradores, mas não me lembro o nome. Sei que era ônibus elétrico.
Valdimira: Tinha a empresa que rodava a cidade baixa a Transur da prefeitura e a Sulamérica do Sr. Manolo.

7°) QUAIS ERAM AS FESTIVIDADES?
Solange: Nós tínhamos o carnaval do bairro que era em toda a Rua Direta, até já teve trio elétrico, mas era bom quando a gente se fantasiava de Pierrô, baianinha e outras fantasias. Colocava as mascaras, e fantasiava as crianças. Também tinha morador que montava barraca pra vender comidas e bebidas, na época se via mais a tradição dos confetes e serpentinas, e depois também alguns moradores aderiram às mortalhas. Ainda tinha a jega de calçola. Há alguns anos atrás tinha também na festividade do bairro, os desfiles, as escolas faziam os desfiles de primavera e passeava com a turma de alunos pelas ruas, era muito lindo, todos fantasiados com um tema escolhido. Minhas filhas participaram já na década de 80.
Ivone: Nosso carnaval era muito bom, era uma festa de rua com blocos, concurso de rainhas, tinha palanques, trio elétrico na época Dodô e Osmar. Tinha também no bairro muita festa de candomblé, roda de samba, capoeira nas ruas, o futebol do bairro virava festa também, meu marido era jogador do time.
Valdimira: O bairro tinha muitas festividades. Lembro bem da jega de calçola que saia no sábado de carnaval percorrendo o bairro até o amanhecer de domingo, era um grande carnaval, o comércio prêmio dos blocos. Tinha escola de samba, trio elétrico jacaré e trio tapajós. O bairro tinha dois blocos de carnaval, o Uruguai Hora H e o bloco Mulheres de Areia que foi presidido por uma mulher, Valdimira e saiu com um trio e tinha mortalhas. O palanque ficava em frente ao bar de Sr. Aloísio Xaxaxá e era feito concurso de fantasias, de Rainha do carnaval e os moradores colocavam cadeiras ao longo das ruas pra ver a festa.


8°) FALE SOBRE A DISCOTECA PRATO QUENTE.
Solange: Era uma discoteca Prato Quente que ficava na Avenida Fernandes da Cunha, minhas irmãs conheceram, mas eu só passava pela porta, nunca entrei, como eu sou a mais velha das filhas, ficava com minha mãe cuidando dos menores. Mas, a turma que freqüentava, dizia que era muito animado, só iam pra paquerar, aproveitavam as músicas românticas internacionais.
Ivone: Eu não cheguei entrar nesta discoteca, era coisa pra moçada, minha filha ia sem nem eu saber.
Valdimira: Não conheci a discoteca.

9°) FALE SOBRE O PROGRAMA MEU BAIRRO É O MAIOR QUE O URUGUAI PARTICIPOU.
Solange: Era o Programa de Tia Arilma, era de auditório, tinha gincana dos bairros, eu me lembro que tinha uma brincadeira, quem não cantasse bem entrava pelo cano, minha irmã Iara foi tão mal na música representando nosso bairro que entrou pelo cano. RS. Mas nosso bairro várias vezes foi vencedor.
            Ivone: Eu não participei deste programa não. O bairro participou com alguns moradores, e se não me falha a memória, foi campeão.
Valdimira: Meu bairro é o maior foi um programa da TV Itapoã,  comandado pela apresentadora Tia Arilma, que levava os bairros a participarem de uma gincana. Nessa época, eu, juntamente com outros jovens, dentre eles, Valdir, Irene, Daniel, Nilton, Tiago, Diana, Antonieta, Wilton, escrevemos o nosso bairro e fomos vencedores na época. A partir daí, me tornei Presidente da Sociedade Comunitária 10 de outubro, nesta, aconteceram vários eventos em prol da nossa comunidade.

10°) QUAIS ERAM AS RELIGIÕES E AS FESTAS RELIGIOSAS DO BAIRRO?
            Solange: Já tinha a Igreja Nossa Senhora dos Mares e os moradores do bairro também iam à Igreja do Senhor do Bonfim, também tinham as casa de candomblé e o Centro Espírita de Divaldo Franco. As festas religiosas tinham quermesse, a lavagem do Senhor do Bonfim, as festas dos orixás nos terreiros de candomblé e todo ano no dia de S. Cosme e S. Damião os moradores devotos jogavam balas e doces na rua para as crianças, hoje são poucos moradores que ainda fazem isso.
Ivone: Na época já tinha uma manifestação dos protestantes, mas tinham mais católicos, as igrejas católicas faziam muitas procissões. Também tinha muito Terreiro de Candomblé no bairro e tinha o Centro Espírita de Divaldo Franco que eu gostava de ir com meu marido. Até hoje ele vai aos Centros Espíritas que tem na cidade baixa.
Valdimira: Tinha a festa de Santo Antônio de Sr. Adilson, o de Srª. Helena da Palestina, o de Srª. Lourdes do salão Rua Direta, o de Srª. Pastora e Srª. Lourdes da Rua Haroldo de Sá eram 13 noites de festas com jazz, o Santo Antônio da professora Suniramis da rua Araújo Bulcão e o seu presépio de natal com muita música e alegria. Tinha as festas do Centro Recreativo do bairro muito comuns aos domingos. Tinha ainda as festas no Terreiro da Ialorixá Maria Rei de Yorubá na Rua 10 de Outubro, principalmente no mês de janeiro onde seguiam em procissão com as baianas a pé até a Igreja do Sr. Do Bonfim festejando a sua  lavagem (sincretismo religioso), onde centenas de pessoas e autoridades compareciam.

11°) COMO ERA O ASPECTO DA RUA HAROLDO DE SÁ?
Solange: Meu pai foi um dos primeiros moradores do bairro e praticamente ajudou a construir a Rua Haroldo de Sá. Também foi feita com restos de lixo e não tinha no início a rede de esgoto, era muito bairro e não asfalto. As casas também eram de madeira, enfeitadas com folhas de pitanga. Tinha um chafariz com 10 torneiras na rua, que abastecia os moradores de outras ruas também.
Ivone: Era como o próprio bairro no inicio, tinha muita lama, não era asfaltada, a iluminação era precária e as casas, a principio eram feitas de madeira, depois que fomos construindo de bloco e cimento, somos praticamente os fundadores da rua.
Valdimira: A Rua Haroldo de Sá era de barro com uma vala nos quintais, e a iluminação veio muito depois. Nós, moradores, fizemos um protesto “reboliço”, para conseguir melhorias na rua.

12°) FALE MELHOR SOBRE O CHAFARIZ QUE EXISTIA NA RUA HAROLDO DE SÁ
Solange: Nosso chafariz tinha 10 torneiras e abastecia os moradores da rua e a vizinhança, que vinham com baldes pegar água.
Ivone: Era um chafariz de grande valia, pois tanto os moradores da rua como os vizinhos pegavam água lá. Tinha 10 torneiras, e as vezes tinha fila pra se abastecer.
Valdimira: O chafariz servia para todos os moradores e ficava no início da rua. Quem tomava conta era um policial, as pessoas pegavam água nos baldes, no jegue, e muitos anos depois que colocaram tubulação de água na Rua Haroldo de Sá.

                                      No local onde funcionava o chafariz da Rua Haroldo de Sá
                               











quarta-feira, 24 de julho de 2013

Meu Bairro é o maior - Uruguai - Rua Haroldo de Sá - Um pedacinho de Salvador – Bahia

 MEU BAIRRO É O MAIOR

            Para entender melhor a história da minha Rua Aroldo de Sá, nada mais justo que conhecer a história do meu bairro Uruguai. Então, as buscas foram feitas, sem muita pretensão, mas com certa expectativa de finalmente saber a origem do seu nome, quais os acontecimentos da época de seu surgimento, como tudo começou, como tornou-se possível este bairro, enfim, onde estou pisando, de que foi feito o meu chão.
            A data de surgimento do bairro Uruguai, não é precisa, data-se do final da década de 40, quando muitos acontecimentos faziam história em nosso país e no mundo. A começar pelo seu nome que é uma homenagem ao campeão mundial de futebol na copa de 50, o país Uruguai, que venceu nossa querida seleção canarinho em nossa casa por 2x1. O contraditório da homenagem é justamente nomear nosso bairro de lutas e batalhas dando-lhe o nome do país que nos derrotou, mas, conhecendo bem meu povo, não me admira, o resultado talvez tivesse sido tão surpreendente que originou nosso nome.
            O bairro Uruguai, situado na conhecida cidade baixa, em Salvador–Ba, é resultado de uma luta travada pela população humilde que aos poucos chegava no local para garantir seus trabalhos, contra a Marinha, pela apropriação de terra para habitação. O local era um vasto manguezal, era maré, uma reserva de peixes, mariscos e crustáceos, tendo casas de palafitas. Ficava em uma das partes da Enseada dos Tainheiros, que se estende pela cidade baixa, formando assim os Alagados, que aos poucos foi sendo aterrado com lixo vindo de diversas partes da cidade. Porém, essa prática era proibida, por isso os caminhões chegavam ao local à noite. Quando amanhecia o dia, a Marinha retirava as palafitas, e no dia seguinte elas eram novamente construídas. Para Milton Santos, a península itapagipana tem terreno “fabricado”, justamente pelo seu calçamento feito dos lixos, uma espécie de depósito.
                                           Palafitas do Uruguai

            Tendo então esse primeiro momento de luta para fincar um espaço de moradia, surge o bairro Uruguai. Na verdade, seu povo, mistura de índios com negros e os brancos, migraram para este local por causa da demanda industrial que crescia na região da cidade baixa, era possível que nos seus arredores houvesse aldeamento indígena que se alojava na enseada marisqueira, afinal, os indígenas foram se aglomerando nos terrenos que encontravam para fazerem suas moradas. Muitos construtores de barcos também faziam parte deste cenário e bem como pescadores, marisqueiros, catadores de caranguejos dos mangues, sendo muitos tidos como mercado informal.

            A indústria era forte na região da cidade baixas e famílias como de Costa e Silva, Vita, Tarquínio e Gonçalves dos Anjos, compunham nosso cenário industrial. Este último, fundou a associação dos moradores local. A Península Itapagipana foi assim ocupada por Fábricas e Indústrias tendo como a primeira a Fábrica de Luiz Tarquínio, A Companhia Empório Industrial do Norte e a Fábrica da Penha, no final do século XIX. Mais tarde surgem as empresas de processamento de produtos agrícolas como a Souza Cruz, de tabaco, a Johanes Industrial, a Daw Química, a Barreto de Araújo e a Chadler de processamento de cacau e uma das campeãs de reclamações feitas pelos moradores por causa da poluição do ar. Além dessas, tivemos as fábricas de produção de sabão, a Amaral Comércio de Papéis, a Fratelli Vita, de vidros e refrigerantes, Fábrica São João, Fábrica Paraguaçu, Fábrica da Fias, Bhering, Toster e Crush. Ao todo foram cerca de 30 fábricas.
                                             Fachada da Fábrica Fratelli Vita
           
                                                            Marca do Produto

                                                    Neste local funcionava a Fábrica de Sabão
                                                    
             Outro fato de grande importância que acontece nos arredores do bairro Uruguai e a suburbana é a Feira do Rolo, também conhecida como fira do “pau”, que acontece sempre nas manhãs de domingo, na Baixa do Fiscal, embaixo do Viaduto dos Motoristas. Há uma mistura de povos que fazem a feira acontecer, pois seu público e seus comerciantes informais, têm pessoas de boa procedência, pais de famílias, desempregados que aproveitam o espaço para ganhar uns “trocados”, bem como tem os considerados mal elementos, que passam roubos no local. Não foi encontrada uma data definida do seu surgimento, mais alguns moradores da região, acreditam que surge talvez antes mesmo do bairro Uruguai, fato este que não tem afirmativa, não há precisão de sua veracidade.
                                             Feira do Rolo

            Na feira do rolo é possível encontrar os mais diversos produtos e mercadorias. São vendidos ou trocados, aparelhos eletrônicos, utensílios domésticos, ferramentas de trabalhos variados, roupas, moveis, alimentos e bebidas, enfim, muitas mercadorias, até animais são encontrados nas vendas e trocas da popular feira do “pau”. Tendo ou não um público de caráter duvidoso, fato comprovado, a feira continua existir e faz parte da realidade do povo da cidade baixa, atraindo ainda, pessoas de outras localidades da cidade de salvador. 
           Outro fato importante é relacionado ao comércio no Uruguai, é a construção do Shopping Bahia Outlet Center, que surgiu no ano de 1997. Ao contrário da Feira do Rolo, este, tem lojas cadastradas (como todo shopping), não é um comércio informal, cresceu muito a popularização do bairro, sendo frequentado tanto pelos moradores, como por pessoas de outras localidades da cidade. Lembro-me que no início, no seu surgimento, alguns de nós moradores do Uruguai, não acreditávamos que seria possível o sucesso do empreendimento, mas, na verdade o shopping permanece a 16 anos como um dos melhores patrimônios comercial do nosso bairro.

            De fato a cidade baixa era fonte de indústrias que resultaram no povoamento, ou melhor, surgimento do bairro Uruguai. Bairro este que chegou a concorrer nos concursos culturais e festeiros intitulado de “Meu bairro é o maior”, isso nada mais era que a tentativa dos seus moradores de homenagear, mais que isto, reverenciar o bairro que nasce dos aterros e abrigam-lhes, dando oportunidade de cidadania e condições de moradias, mesmo que precariamente. Enfim, um bairro com identidade misturada, mas própria.


MEU ENDEREÇO – MINHA IDENTIDADE

                                                                 Rua Haroldo de Sá
            O mundo é realmente vasto, e pensar que nessa imensidão de chão e céus eu me encontro num lugar no qual posso me sentir literalmente em casa, sim, no meu território, meu local, meu pedacinho de mundo diante de tamanha imensidão. É assim que me sinto na Rua Haroldo de Sá.
            Como já bem sabemos, a cidade baixa era polo industrial e atraia pessoas para fazerem suas moradias nos seus arredores, como a população do bairro Uruguai. Neste aglomerado de ruas, antigas palafitas e povos atraídos por uma oportunidade de emprego e habitação, surge então, a Rua Haroldo de Sá
            O endereço supracitado faz parte de minha vida desde que nasci e retornei da maternidade Sagrada Família localizada no Bonfim, rua esta, já habitada por minha família desde os primórdios de sua construção por volta da década de 50, talvez final da deã. 40, não há precisão de data. Rua que vivi até os meus 13 anos de idade, até maio de 1993, sem nunca ter me afastado ou ausentado totalmente, pois sempre estava em casa de parentes, e que finalmente retornei em dezembro de 2005 e permaneço sem previsão de partida.
             Nesta rua conheci as lutas do nosso povo que já vinha sendo travada desde o surgimento do bairro Uruguai, quando estava em processo de aterragem. Uma luta que permanece nos dias de hoje sem perspectivas de melhoras, pois, a precariedade no asfaltamento, na rede de esgotos, e na coleta de lixo é gritante e fica cada vez mais berrante nos tempos de chuva. Há quem diga que a culpa é da má construção, foi feita abaixo do nível do mar, mas seja lá o que for, nos mantemos firmes, buscando soluções, e alguns, tentando fazer sua contribuição por melhora de moradia.
            Foi nesta rua que conheci a solidariedade humana, é nestes momentos de chuva e conseqüente alagamento, que os moradores se unem em socorros dos vizinhos prejudicados, mais que isto, neste local tive certeza da inocência e leveza das crianças que aproveitam as inundações para brincarem de fazer barquinhos e sorriem como se não estivesse nada de ruim acontecendo. De fato para nossas crianças o mundo muitas vezes é um lindo e divertido faz de contas, e tudo que elas querem é brincar e rir de tudo.

            Mas nem tudo é só luta e sofrimentos, pois, tivemos muitas comemorações na Rua Haroldo de Sá. Sim, foram muitas gincanas, festas das mães e pais, muitos natais e o São João que continua sendo com tradicional quadrilha e forró, aliás, uma gigante quadrilha formada por moradores. Ainda me lembro de também de reunir a turma pra brincar das mais diversas brincadeiras, pega-pega, amarelinha, baleado, sete pedrinha, pique esconde, eram tantas, e hoje vejo as atuais crianças dando continuidades a todas elas e inventando novas travessuras.
            Na verdade, conheci outras moradas, em outros endereços, mas, é na Rua Haroldo de Sá que me sinto a vontade, de certa forma acolhida, amparada, enfim, me sinto em casa. Por isso mesmo, despertou-me o desejo de conhecer a história da nossa gente, nosso bairro, nossa cidade, e tudo que implicou sua construção, seu surgimento, que apesar de não ter uma data precisa (não tive esse acesso), tem todo um contexto a ser conhecido e assim analisado.
            Enfim, adentro até onde posso, até onde tive acesso, na minha morada, na minha casa, no pedacinho de mundo situado na Bahia, em Salvador, no Uruguai, no CEP 40450410, “minha” rua de todos nós, que sofreu modificações em sua arquitetura, mas, se mantém a mesma desde sempre.

 CURIOSIDADES: 
  • No período de sua construção, a Rua Haroldo de Sá dispunha de um chafariz com 10 torneiras que abastecia seus moradores e também a vizinhança;
  •  As casas do bairro Uruguai e da rua Haroldo de Sá eram feitas de madeira, com chão feito de areia batida e alguns moradores enfeitavam-na com folhas de pitanga;
  •  Na década de 70 os moradores do bairro Uruguai se divertiam na Discoteca Prato Quente;
  •  Era possível comprar pão na porta de casa, pois, tinha um homem que passava de bicicleta ou carroça vendendo (ambulante);
  • O bairro Uruguai já venceu uma gincana televisiva, no programa Meu Bairro é o maior, apresentado por Tia Arilma;
  • Os moradores do Uruguai organizavam o carnaval do bairro;
  • Nas proximidades do bairro Uruguai, na Rua Barão de Cotegipe, existiu uma empresa de ônibus elétrico.




                                                                 Ônibus elétrico

  
SALVADOR – PRIMEIRA CAPITAL DO BRASIL

                  Para conhecer a história do meu bairro, da minha rua, eu não compreenderia se não conhecesse  seu contexto. Por isso, conhecer primeiro a história da Cidade do Salvador foi de grande importância, pois há uma relação do que resulta na construção do meu lugar. 
                A cidade de Salvador nasce em 1549 (fato já supracitado) na Colina da Sé, sendo idealizada (a primeira cidade das Américas criada com proposito consciente) para abrigar os portugueses vindos desde o descobrimento, e servir como “base” de suas tropas, na tentativa de evitar os invasores. Feita sob o desenho de Luís Dias, em Portugal, ainda hoje podemos visualizar sua aparência mais antiga, mantida no centro histórico.

            Desde o surgimento da cidade do Salvador, teve início o tráfico negreiro, no qual os negros africanos eram trazidos para servirem de escravos, colocando suas forças braçais para a construção e manutenção da nova cidade. Por causa da vinda do povo da África, sendo misturados aos índios e aos europeus, nossa gente nasce dessa miscigenação que nos torna o que alguns preferem chamar de multirraciais. Dependendo da localidade dos seus bairros essa mistura pode ser mais acentuada ou não.
            No seu início, Salvador era tomada por matas atlânticas que logo foram exploradas, para que estradas fossem construídas e para que sua madeira fosse aproveitada e exportada para riqueza dos colonos, que também se valiam principalmente da cana-de-açúcar, nosso maior bem. Tanto que, em 1576 já contavam 18 engenhos do produto no recôncavo. A nossa fauna também despertava a cobiça da Europa, movimentando assim os portos, com as grandes frotas de navios mercantes.

            Durante três séculos, a cidade de Salvador foi a mais importante e mais populosa aglomeração urbana do Brasil, pois sua demanda comercial e até industrial, atraia cada vez mais a população brasileira. Sua paisagem é rica de contrastes, devido à sua multiplicidade de estilos, de idade de casas, e a já citada mistura de raças; gentes de todas as cores se misturam nas ruas, além de sua divisão territorial: cidade baixa e cidade alta, na qual divide-se também a classe social. Temos uma cidade de praias, de palafitas, de invasões, que consequentemente resulta na construção de vários bairros com características sociais bem peculiares à suas demandas.
Com o passar dos séculos, Salvador continuou crescendo como centro de comércios primeiramente,  indústrias e cultura, era a princípio um polo comercial. Nossas fontes continuaram sendo cana-de- açúcar, madeiras, faunas exóticas e também a parte marítima ganhou força. Com o passar dos anos, alguns bairros da nossa capital serviram com maior veemência para a industrialização e devido a sua demanda, povos foram migrando para esses bairros e construindo novas moradias. Assim nasce as moradias precárias que somente atendia o capitalismo, mas, não ofereciam condições de habitação adequadas, e isso continua sendo fato nos dias atuais. Salvador passa então a ser um polo industrial.
            Devido então, a grande demanda industrial, que se concentrava boa parte na Península Itapagipana, cidade baixa de Salvador, houve a necessidade de expandir moradias e a região conhecida como alagados transformaram-se bairros novos, o que para os ambientalistas, ajudou a devastar o meio ambiente e crescer o numero de moradias precárias. A verdade é que muitos trabalhadores invadiram este espaço para poder garantir seus empregos, o que facilitava também para os empresários.
            Fica assim entendido que nossa Cidade Salvador nasce com propósitos bem delineados de expansão de terras para os colonizadores, abrigo e até mesmo campo de batalha, e aos poucos foi servindo também para o comércio, a industrialização, as grandes exportações e tendo com isso um crescimento de moradias e trabalho.


* As informações aqui postadas são resultado de pesquisas (referência abaixo)  e entrevista com moradores locais.


REFERÊNCIAS

Revista da Bahia, V. 33, nº 18, setembro/novembro de 1990. Empresa Gráfica da Bahia, 1990 Trimestral.

em 11 de maio de 2013 as 9:10 hs.






BREVE NOVAS POSTAGENS (Entrevista com moradores do Bairro Uruguai/ Rua Haroldo de Sá)!