ENTREVISTA SOBRE O BAIRRO URUGUAI
E A RUA HAROLDO DE SÁ
Três moradoras
do bairro Uruguai deram suas contribuições para nosso blog, concedendo uma
entrevista que me facilitou conhecer melhor o meu lugar. São elas: Sª. Ivone
Cruz – 76 anos de idade e Sª. Solange Bastos – 60 anos de idade (minha mãe), Srª. Valdimira.
1°) QUAL A ORIGEM NO NOME DO BAIRRO?
As Três pessoas entrevistadas disseram que
o nome foi influenciado pela vitória da Seleção de Futebol do Uruguai sobre a
Seleção Brasileira na copas de 1950, mas não sabem quem decretou o nome.
Contudo, a Sª. Valdimira relatou que na verdade há especulações, mas ninguém
afirma ao certo a origem do nome: “uns
diziam era Mares Alagados, outros diziam que era Rua Direta dos Mares, o lado
da Regis Pacheco foi chamado de Tomé de Souza que incluíram como Uruguai. Só
que o Sr. Paulo Bispo que foi presidente da sociedade Tomé de Souza fez uma
solicitação à Câmara de Vereadores e o bairro voltou a ser chamado de Tomé de
Souza e o Outro lado de Uruguai e Alagados por causa das palafitas”.
2°) COMO FOI CONSTRUÍDO O BAIRRO?
Solange: Foi construído com restos de lixos pelas pessoas que moravam
nos alagados (Seu pai Olavo Bastos lhe contou a história).
Ivone: Antes o bairro era um manguezal e depois foi invadido e
construído com restos de lixo e restos da maré.
Valdimira: O bairro foi entulhado, começando da Regis
Pacheco, Rua Direta e Baixa do Fiscal. As primeiras casas eram de madeira sob
as águas. Assim foram formando as ruas, Haroldo de Sá, Inácio de Loiola,
Ramagem Badaró, daí veio as casas de Sopapos (barro). Utilizavam os lixos da
cidade e assim as ruas eram feitas.
3°) COMO ERA NO INÍCIO O ASPECTO DO BAIRRO?
As três pessoas entrevistadas disseram que
tinha muito lixo, maré, as primeiras casas eram de madeira, os chãos das casas
eram de areia batida, antes de construir a ruas só existiam avenidas e vilas e
que não tinha rede de esgoto.
Solange: Antes só existia maré, casa
de madeira, não tinha saneamento básico, era construído de resto de lixo e
cascalho de mariscos, as casas eram de madeira e o chão tinha areia batida.
Ivone: Sem luz, a iluminação era com
candeeiro e fifó, tinha muita lama e por isso muitos insetos.
Valdimira: O
bairro tinha um aspecto de estrema pobreza, onde os moradores eram operários da
construção, eram os pedreiros, ambulantes, vidreiro, pescadores, lavadeiras,
costureiras que ajudaram a construir o bairro. Era um lugar muito simples, com
pouca iluminação.
4°) COMO ERA O COMÉRCIO, A FORMA DE TRABALHO?
Solange: Tinha muitas quitandas, a
feira do curtume, a feira do rolo que vendia coisas velhas, frutas, e fazia
troca de objetos, tinha o rapaz do pão que ia de bicicleta ou na carroça, tinha
a fábrica de sabão que ficava onde agora funciona o Atacadão Recôncavo e tinha
a empresa de ônibus elétrico CBTC. Eu lembro que tinha também os
marisqueiros.
Ivone: A única forma de trabalho era
com vendas tipo quitanda, feira do curtume e biroscas.
Valdimira: O
comércio era um armazém como o armazém 70 na entrada da rua Araújo Bulcão, a
feira de são Joaquim e os bares que também vendiam peixe, farinha, feijão e
etc.
5°) QUAIS ERAM AS ESCOLAS DO BAIRRO? FALE SOBRE A ESCOLA DE Profª
Carmelita.
Solange: Tinha a Escola Pública Jesus
Cristo, a Escola Bom Jesus que era um convento também, e a Escola de D.
Carmelita era a Levi Miranda que foi a primeira escola particular que eu me
lembro, a maioria dos moradores que podiam pagar pelos estudos, estudaram lá e
hoje a escola tem o nome O Alfa.
Ivone: Tinhas as escolas públicas,
eu me lembro que uma virou convento, era a Escola Bom Jesus, e a Escola Levi
Miranda de D. Carmelita era muito boa, era particular, iniciou em sua
residência e depois foi ampliando e transformando numa escola, mesmo tendo a
casa da família num dos andares, as professoras todas são da mesma família.
Meus filhos e netos estudaram lá. Hoje a escola tem outro nome e minha bisneta
estuda nela, agora é O Alfa.
Valdimira: Apesar
da pobreza do bairro e da pouca condição de moradia, alguns moradores
conseguiram estudar, uns formara-se professores, militares, médicos, mas havia
muitas dificuldades. Com a fundação da sociedade Tomé de Souza em 1952, que
levou o nome do bairro à Câmara de Vereadores, muitos benefícios forma
conseguidos como a Escola Tomé de Souza, onde estudou Paulo Bispo da Silva,
Biomásio, Orlando, Mestre Olavo... Muitos foram presos do golpe militar em
1964, até mulheres fazem parte dessa história. Foi criada em 1952 a Sociedade 10 de
Outubro que seus moradores mantém até hoje e que ajudou o bairro a crescer na
educação, depois foi criado o Centro recreativo e Cultural do bairro, tinha a
escola Tomé de Souza que ainda existe, a Almerinda Costa e a Levi Miranda que
hoje é conhecida como Escola O Alfa.
Imagens da Escola O alfa (Antiga Escola Levi Miranda)
6°) FALE SOBRE A EMPRESA DE ÔNIBUS QUE TINHA NO BAIRRO.
Solange: A empresa ficava no largo de
Roma perto aqui do Uruguai. Era um ônibus grande, em cima tinha fios. Não me
lembro bem o nome da empresa, mas acho que era CMTC.
Ivone: Tinha
um ônibus que rodava no bairro e supria a necessidade dos moradores, mas não me
lembro o nome. Sei que era ônibus elétrico.
Valdimira: Tinha
a empresa que rodava a cidade baixa a Transur da prefeitura e a Sulamérica do
Sr. Manolo.
7°) QUAIS ERAM AS FESTIVIDADES?
Solange: Nós tínhamos o carnaval do
bairro que era em toda a Rua Direta, até já teve trio elétrico, mas era bom
quando a gente se fantasiava de Pierrô, baianinha e outras fantasias. Colocava
as mascaras, e fantasiava as crianças. Também tinha morador que montava barraca
pra vender comidas e bebidas, na época se via mais a tradição dos confetes e
serpentinas, e depois também alguns moradores aderiram às mortalhas. Ainda
tinha a jega de calçola. Há alguns anos atrás tinha também na festividade do
bairro, os desfiles, as escolas faziam os desfiles de primavera e passeava com
a turma de alunos pelas ruas, era muito lindo, todos fantasiados com um tema
escolhido. Minhas filhas participaram já na década de 80.
Ivone: Nosso carnaval era muito bom,
era uma festa de rua com blocos, concurso de rainhas, tinha palanques, trio
elétrico na época Dodô e Osmar. Tinha também no bairro muita festa de
candomblé, roda de samba, capoeira nas ruas, o futebol do bairro virava festa
também, meu marido era jogador do time.
Valdimira: O
bairro tinha muitas festividades. Lembro bem da jega de calçola que saia no
sábado de carnaval percorrendo o bairro até o amanhecer de domingo, era um
grande carnaval, o comércio prêmio dos blocos. Tinha escola de samba, trio
elétrico jacaré e trio tapajós. O bairro tinha dois blocos de carnaval, o
Uruguai Hora H e o bloco Mulheres de Areia que foi presidido por uma mulher,
Valdimira e saiu com um trio e tinha mortalhas. O palanque ficava em frente ao
bar de Sr. Aloísio Xaxaxá e era feito concurso de fantasias, de Rainha do carnaval e os moradores colocavam cadeiras
ao longo das ruas pra ver a festa.
8°) FALE SOBRE A DISCOTECA PRATO QUENTE.
Solange: Era uma discoteca Prato
Quente que ficava na Avenida Fernandes da Cunha, minhas irmãs conheceram, mas
eu só passava pela porta, nunca entrei, como eu sou a mais velha das filhas,
ficava com minha mãe cuidando dos menores. Mas, a turma que freqüentava, dizia
que era muito animado, só iam pra paquerar, aproveitavam as músicas românticas
internacionais.
Ivone: Eu não cheguei entrar nesta
discoteca, era coisa pra moçada, minha filha ia sem nem eu saber.
Valdimira: Não
conheci a discoteca.
9°) FALE SOBRE O PROGRAMA MEU BAIRRO É O MAIOR QUE O URUGUAI
PARTICIPOU.
Solange: Era o Programa de Tia Arilma,
era de auditório, tinha gincana dos bairros, eu me lembro que tinha uma
brincadeira, quem não cantasse bem entrava pelo cano, minha irmã Iara foi tão
mal na música representando nosso bairro que entrou pelo cano. RS. Mas nosso
bairro várias vezes foi vencedor.
Ivone:
Eu
não participei deste programa não. O bairro participou com alguns moradores, e
se não me falha a memória, foi campeão.
Valdimira: Meu bairro é o maior foi um programa da TV Itapoã, comandado pela apresentadora Tia Arilma, que
levava os bairros a participarem de uma gincana. Nessa época, eu, juntamente
com outros jovens, dentre eles, Valdir, Irene, Daniel, Nilton, Tiago, Diana,
Antonieta, Wilton, escrevemos o nosso bairro e fomos vencedores na época. A
partir daí, me tornei Presidente da Sociedade Comunitária 10 de outubro, nesta,
aconteceram vários eventos em prol da nossa comunidade.
10°) QUAIS ERAM AS RELIGIÕES E AS FESTAS RELIGIOSAS DO BAIRRO?
Solange:
Já
tinha a Igreja Nossa Senhora dos Mares e os moradores do bairro também iam à
Igreja do Senhor do Bonfim, também tinham as casa de candomblé e o Centro
Espírita de Divaldo Franco. As festas religiosas tinham quermesse, a lavagem do
Senhor do Bonfim, as festas dos orixás nos terreiros de candomblé e todo ano no
dia de S. Cosme e S. Damião os moradores devotos jogavam balas e doces na rua
para as crianças, hoje são poucos moradores que ainda fazem isso.
Ivone: Na época já tinha uma
manifestação dos protestantes, mas tinham mais católicos, as igrejas católicas
faziam muitas procissões. Também tinha muito Terreiro de Candomblé no bairro e
tinha o Centro Espírita de Divaldo Franco que eu gostava de ir com meu marido. Até
hoje ele vai aos Centros Espíritas que tem na cidade baixa.
Valdimira: Tinha
a festa de Santo Antônio de Sr. Adilson, o de Srª. Helena da Palestina, o de
Srª. Lourdes do salão Rua Direta, o de Srª. Pastora e Srª. Lourdes da Rua
Haroldo de Sá eram 13 noites de festas com jazz, o Santo Antônio da professora
Suniramis da rua Araújo Bulcão e o seu presépio de natal com muita música e
alegria. Tinha as festas do Centro Recreativo do bairro muito comuns aos
domingos. Tinha ainda as festas no Terreiro da Ialorixá Maria Rei de Yorubá na
Rua 10 de Outubro, principalmente no mês de janeiro onde seguiam em procissão
com as baianas a pé até a Igreja do Sr. Do Bonfim festejando a sua lavagem (sincretismo religioso), onde
centenas de pessoas e autoridades compareciam.
11°) COMO ERA O ASPECTO DA RUA HAROLDO DE SÁ?
Solange: Meu pai foi um dos primeiros
moradores do bairro e praticamente ajudou a construir a Rua Haroldo de Sá.
Também foi feita com restos de lixo e não tinha no início a rede de esgoto, era
muito bairro e não asfalto. As casas também eram de madeira, enfeitadas com
folhas de pitanga. Tinha um chafariz com 10 torneiras na rua, que abastecia os
moradores de outras ruas também.
Ivone: Era como o próprio bairro no
inicio, tinha muita lama, não era asfaltada, a iluminação era precária e as
casas, a principio eram feitas de madeira, depois que fomos construindo de
bloco e cimento, somos praticamente os fundadores da rua.
Valdimira: A
Rua Haroldo de Sá era de barro com uma vala nos quintais, e a iluminação veio muito
depois. Nós, moradores, fizemos um protesto “reboliço”, para conseguir
melhorias na rua.
12°) FALE MELHOR SOBRE
O CHAFARIZ QUE EXISTIA NA RUA HAROLDO DE SÁ
Solange: Nosso chafariz tinha 10
torneiras e abastecia os moradores da rua e a vizinhança, que vinham com baldes
pegar água.
Ivone: Era um chafariz de grande
valia, pois tanto os moradores da rua como os vizinhos pegavam água lá. Tinha
10 torneiras, e as vezes tinha fila pra se abastecer.
Valdimira: O
chafariz servia para todos os moradores e ficava no início da rua. Quem tomava
conta era um policial, as pessoas pegavam água nos baldes, no jegue, e muitos
anos depois que colocaram tubulação de água na Rua Haroldo de Sá.